sexta-feira, 12 de outubro de 2007

de um 12 de outubro

"[...] quatro mãos que a tocaram tão inesperadamente que ela fez a coisa mais certa que poderia ter feito no mundo dos movimentos: ficou paralisada. Eles, cujo papel predeterminado apenas o de passar junto do escuro de seu medo, e então o primeiro dos sete mistérios cairia; eles que representariam apenas o horizonte de um só passo aproximado, eles não compreenderam a função que tinham e, com a individualidade dos que têm medo, haviam atacado. [...]"

Um suspiro de sufoco.
"Não, o motorista não deveria parar aqui...
Eu preciso terminar de ler esse conto. Mas é melhor ficar atenta as pedras..." (essa paixão alienada, estampada em seus rostos, os faz urrar, bater, morrer!)
Troncos para fora do ônibus, e dezenas de sombras "surfam" com experiência; se enraivecem pela falta de "animação" (e de pedras) dos seguidores da Torcida.
O menino do lado me explicava eduacadamente (e com timidez) que
"não, não foi clássico. [...] É bom tomar cuidado que pode ter pedra nessa área. [...] Na verdade são dois bairros que não se dão muito bem, mas são do mesmo time."
Uma parada vazia, um suspiro de alívio.
A senhora da frente (quarenta anos, talvez) fechava o vidro, e logo em seguida levava a mão à testa, desacreditada no que estava presenciando. Ela estava em pânico, eu sabia. Eu sabia porque também estava em pânico. Mas tentava disfarçar fazendo ar de indiferença... minha testa sempre entrega essas pequenas dissimulações.


"J de jovem, O, organização, o V é de vida, o E de emoção!, no final tem M que é moral...!!!!!!"


Agora só faltam duas! Duas e eu fico mais longe deles!
"Aqui o ônibus pára sim." Era bonzinho, o menino do lado.
Finalmente desci. De fato, eram dezenas de sombras, mais até do que eu havia imaginado; completamente desesperados por um pouco de emoção. Cheguei a acreditar que ao descerem, apedrejariam sem dó o transporte que até então lhes fora tão útil. Apedrejariam todos - sendo ou não: da mesma camisa; do mesmo bairro; da mesma idade; do mesmo planeta...
Apedrejariam.


Só estaria realmente segura quando abrisse o portão...Não, quando entrasse em casa... Quando se trancasse no quarto!
Quando terminasse aquele conto.

"[...] Ela não os olhou porque sua cara ficou voltada com serenidade para o nada. Mas pela pressa com que a magoaram soube que eles tinham mais medo que ela. Tão assustados que já não estavam mais ali. [...]"


Trechos "Preciosidade" - Clarice Lispector

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